É a Trova Poesia Minimalista?

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É A TROVA POESIA MINIMALISTA?

     Muitos poetas não ligados à UBT usam a Internet como ferramenta de divulgação dos seus trabalhos e meio de intercâmbio.      Recentemente, olhando um site de poesia, eu deparei com a afirmação de que a trova é um exemplo de Poesia minimalista. Aquilo que li me conduziu a esta reflexão de agora, que – espero – seja de utilidade para os amantes da Trova.

     O que é “minimalismo”?      

     Esse nome meio pernóstico deriva de “mínimo” e denota a arte feita com o mínimo possível de elementos. A música, por exemplo, é composta com base em um acorde de poucas notas e de duração breve. A pintura se caracteriza pelo emprego do mínimo de cores possíveis. O conto se caracteriza pela economia de frases, compondo-se a história em menos de uma página e, quando possível, em apenas um parágrafo.

      Na Poesia, portanto, o leitmotiv é o mesmo: economia verbal, versos de uma, duas ou três linhas. Um poema minimalista é o mais enxuto possível, apelando para figuras de linguagem (como todo poema deveria ser, afinal) e com um título de natureza metafórica, que induza o leitor a tentar relacioná-lo com o conteúdo, de preferência um substantivo sozinho, sem acompanhamentos. A linguagem minimalista se caracteriza pelo uso de verbos e substantivos como núcleos do enunciado poético, sem a presença de adjetivos ou advérbios. Trata-se, evidentemente, de um texto “seco”, sem ornamentos.

     Portanto, notamos que a Trova, aparente semelhança com a poesia minimalista, ela não pode ser considerada como tal. Vejamos por que:

     1. A Trova não tem título.

     O poema minimalista obrigatoriamente deve ter título, um título geralmente “enigmático”, metafórico, que force o leitor a pensar. A trova, conforme sua concepção, dispensa título.

     2. Apesar do pequeno espaço, a trova não é um poema “enxuto”.

     A trova é paradoxal. Apesar de ser uma estrofe de apenas de quatro versos, ela não é um poema caracterizado por economia verbal. Não que seja verborrágica: afinal de contas, a exigüidade de espaço não o permitiria. No entanto, se analisarmos muitas trovas – mesmo as consagradas – perceberemos que a idéia central da trova está nos dois versos finais, e os dois primeiros muitas vezes servem de introdução à sentença expressa no desfecho. Em termos sintáticos, por exemplos, não raro o primeiro ou o segundo verso são orações adverbiais, isto é, frases que expressam circunstâncias. Isto não é economia verbal.

     3. Adjetivos e advérbios estão presentes na trova.

     A poesia minimalista prescinde de adjetivos e advérbios. Dada a economia de expressão, a poesia minimalista evita modificadores e sintagmas adverbiais. Na trova, embora seja desejável evitar-se a adjetivação excessiva, nem sempre é possível deixar de usar um modificador. E os advérbios, como expressam circunstâncias de tempo, modo, lugar, intensidade, etc, são muito usados, principalmente na trova lírica e na trova humorística.

     4. Modernidade X Tradição.

     A trova é um poema de forma fixa e com rimas. A poesia minimalista emprega rimas e regularidade silábica ocasionalmente. No caso da trova, a obrigatoriedade da redondilha muitas vezes conduz ao alargamento da frase, à inserção de expressões do tipo “sempre”, “às vezes”, “até”, “talvez”, que – se não são preenchedores discursivos – são elementos acessórios. Pensar a extensão do poema como elemento constituinte significativo do efeito estético não é nada novo. Já Edgar Allan Poe (1809-49), no seu célebre ensaio “Filosofia da Composição”, entendia a brevidade como elemento caracterizador e indispensável da lírica. Um poema lírico que não possa ser lido de uma assentada só é, segundo Poe, ineficaz – a “elevação da alma” e a “excitação intensa” (com estas expressões ele define o prazer estético) esfumam-se. Poe chega mesmo a duvidar de que exista, de fato, poemas longos, pois que eles não passam de “uma sucessão de poemas curtos, de efeitos poéticos breves”. O que diz Poe pode ser aplicado tanto à Trova quanto à poesia minimalista em si, mas a economia lingüística é algo que se consolida na literatura moderna, e a trova é uma forma fixa e tradicional. Nela, a rima e a métrica são elementos obrigatórios e que, muitas vezes, constituem um desafio para a construção do poema. No minimalismo, a regularidade silábica e a rima são ocasionais.

     Termino esta consideração exemplificando com dois poemas, um minimalista de Marco Bastos e uma trova de Aloísio Alves da Costa:

SINTESE E METÁFORA

lá fora uma pipa - sinestesia
é a poesia solta no espaço.
Marco Bastos

Quando a vida se complica
nas horas de solidão,
amigo é aquele que fica
depois que os outros se vão.
Aloísio Alves da Costa